PAISAGENS COM ALMA: CONCEPÇÃO DE ESPAÇOS QUE LIGAM A NATUREZA, AS PESSOAS E O FUTURO
Correia-Tintinger nasceu do encontro entre Joëlle Tintinger e Luísa Correia, duas arquitectas paisagistas com percursos complementares na Bélgica e em Portugal. Joëlle, apaixonada por arte, arquitetura e urbanismo, centra o seu trabalho nos valores humanos e na relação entre as pessoas, a cidade e a natureza. Luísa, com experiência internacional e um grande interesse pela ecologia, história e património, traz uma visão enraizada na sustentabilidade e na recuperação da paisagem.
Juntos, criaram um atelier que combina sensibilidade cultural, rigor técnico e criatividade, com o objetivo de conceber espaços que melhorem a qualidade de vida e interajam em harmonia com o seu ambiente.
1. Como descreveria o ADN da Correia-Tintinger e que papel desempenha a sustentabilidade em todos os seus projectos?
O ADN da Correia-Tintinger é uma mistura única de diversas experiências, culturas e origens, reunidas para criar uma perspetiva distinta no nosso trabalho. Esta diversidade alimenta a nossa criatividade e permite-nos abordar cada projeto com uma visão ampla, inclusiva e ponderada.
A sustentabilidade está subjacente a tudo o que fazemos. Não é apenas um princípio orientador, é uma parte essencial do nosso processo de conceção, desde a escolha dos materiais até à forma como consideramos o impacto a longo prazo dos nossos projectos, tanto no ambiente como nas comunidades que servem. O nosso objetivo é criar espaços que não sejam apenas bonitos e funcionais, mas também responsáveis, resilientes e que cuidem das gerações futuras.
2. Quais são os valores fundamentais que orientam a sua prática profissional e como se reflectem na sua relação com os clientes e colaboradores?
A curiosidade e o desejo constante de aprender orientam a nossa prática. Determinam a forma como interagimos com os nossos clientes e colaboradores: ouvindo atentamente, partilhando abertamente e adaptando-nos cuidadosamente a cada contexto único. Esta abordagem garante que cada projeto beneficia de colaboração, criatividade e respeito mútuo.
3. Que aspectos destacaria na conceção e criação de espaços ou paisagens em comparação com outras agências de paisagem?
Uma das caraterísticas distintivas da nossa abordagem é a nossa preocupação com o impacto social dos espaços. Procuramos conceber paisagens que não só respondam aos desafios ambientais e ecológicos do nosso tempo, mas também criem espaços que sejam funcionais, inspirem comportamentos sustentáveis e promovam o bem-estar das comunidades.
4. Como vê a evolução do design paisagístico nos próximos anos e que papel gostaria que a Correia-Tintinger desempenhasse nessa evolução?
Vemos uma necessidade crescente de criar espaços urbanos mais verdes que ajudem as cidades a adaptarem-se às alterações climáticas, promovendo simultaneamente a interação social e estilos de vida mais saudáveis. A nossa ambição é que a Correia-Tintinger esteja na vanguarda da criação de paisagens resilientes, inclusivas e significativas que beneficiem tanto as pessoas como o ambiente.
5. Trabalha em jardins privados, bem como em parques urbanos, projectos de recuperação de património e certificações ambientais (BREEAM, Natagora). Que desafios e lições aprenderam com esta diversidade de escalas e contextos?
Trabalhar em diferentes escalas - desde jardins privados a parques urbanos e sítios patrimoniais - ensina-nos a ser flexíveis. Cada contexto apresenta necessidades únicas: conciliar os requisitos humanos e ecológicos, respeitar a história ou cumprir as normas de sustentabilidade. Estas experiências reforçam a nossa capacidade de criar paisagens bem pensadas, funcionais e com significado em todos os ambientes.
6. Como integra as dimensões sociológica e cultural nos seus projectos para que os espaços sejam apropriados e apreciados pelas suas comunidades?
Integramos estas dimensões observando e ouvindo ativamente as comunidades que irão utilizar os espaços. A compreensão dos hábitos locais, das interações sociais, das tradições e dos valores culturais permite-nos conceber ambientes que sejam familiares, inclusivos e significativos. Ao incorporar este conhecimento nos nossos projectos, criamos espaços que promovem a ligação, a partilha de experiências e um sentimento de pertença, assegurando simultaneamente a sua funcionalidade e beleza.
7. Graças à sua experiência internacional, que valores conseguiu desenvolver ao trabalhar com equipas multidisciplinares em diferentes contextos geográficos?
A exposição a diferentes perspectivas, culturas e métodos de trabalho reforçou a nossa capacidade de comunicar eficazmente, de respeitar diferentes abordagens e de encontrar soluções criativas que integrem múltiplas competências.
8. Que marca ou legado pretende deixar nas cidades, comunidades e paisagens em que desenvolveu os seus projectos?
O nosso objetivo é deixar um legado de paisagens resilientes, inclusivas e únicas que promovam a ligação social, incentivem uma vida sustentável e melhorem o bem-estar. Os nossos projectos esforçam-se por tornar as cidades mais verdes, mais vivas e mais habitáveis para as gerações futuras.
9. Que projeto público destacaria como uma referência na sua carreira? E qual o projeto privado que considera particularmente significativo?
______
Luísa: Entre os projectos públicos, destaco a Praça do Império em Lisboa, onde trabalhei na equipa daACB Arquitetura Paisagista. Foi um passo importante na conceção de jardins históricos e a minha primeira experiência numa zona patrimonial. O projeto ensinou-me muito sobre como gerir as expectativas do público e dos políticos, ao mesmo tempo que se produzia um projeto de alta qualidade que respeitava os planos originais.
Em termos de projectos privados, destaco o AXS Namur, no qual trabalhei com a Joëlle na agência Skope. Este projeto apresentou muitos desafios, incluindo a obtenção da certificação BREEAM, a coordenação de vários especialistas e a resolução de problemas técnicos e de conceção complexos. Foi uma experiência muito gratificante em termos de trabalho de equipa, resolução de problemas e realização de um projeto paisagístico privado de alto nível.
EQUIPA DE PROJECTO: J. Tintinger - L. Correia em colaboração com Skope (paisagismo) e Montois Arquitectos (edifício) - Nature In Progress (ecologista) - BECI (trabalhos exteriores) - Matriciel (peritagem e avaliação BREEAM, PEB e TS) - SECO (estabilidade) - D2S (acústica) - GEO LAM (topógrafo: levantamentos, layouts e levantamentos de terreno) - PS2 (coordenação de segurança e saúde) - Universoil (drenagem)
FOTOS: J. Tintinger. Tintinger
EXECUTADO POR: Cordeel - SM BPC Wust Thomas & Piron (edifícios) - Entreprises Melin SA (paisagismo)
CONCLUSÃO DO PROJECTO: 2024
______
Joëlle : Em 2007, participei num concurso para transformar o Jardin de la Source em Louvain-la-Neuve (Bélgica), em colaboração com a agência D+A International, numa infraestrutura turística ligada ao Museu Hergé. Um antigo parque de estacionamento situado numa floresta degradada devia tornar-se um espaço público acessível e atraente. A ideia central era criar um parque urbano em harmonia com a cidade, onde a rede de clareiras e de caminhos florestais funcionaria como praças e ruas, oferecendo zonas de encontro e de relaxamento.
O projeto foi articulado em dois níveis: a parte inferior, inspirada na arquitetura do museu, evocava um barco rodeado de sebes ondulantes e de árvores que funcionavam como bóias; a parte superior manteve um carácter mais natural, com clareiras diferenciadas em função da sua localização. O jardim integrou arte, mobiliário, painéis pedagógicos, instalações desportivas e zonas de piquenique, dando prioridade à mobilidade dos peões e dos ciclistas, à acessibilidade universal e à proteção da biodiversidade - evitando, por exemplo, a poluição luminosa.
O projeto foi desenvolvido em estreita colaboração com os residentes locais, a universidade e o conselho local, prestando especial atenção à regeneração da floresta e às relações com a escola. A primeira fase foi inaugurada ao mesmo tempo que o museu, em 2009, e a segunda foi concluída em 2011. Atualmente, este parque é um exemplo de como os espaços verdes podem melhorar a qualidade de vida urbana, integrar a história e a natureza e ser rapidamente apropriados pela comunidade.
GESTÃO DO PROJECTO: INESU - Université catholique de Louvain - La Croix de l'Aigle
EQUIPA DE PROJECTO: J. Tintinger em colaboração com D+A International SMPA SA (paisagismo) - Atelier Christian de Portzamparc (edifício) - INCA Ingénieurs
FOTOS: J. Tintinger
DESENVOLVIDO POR: Lesuco
PROJECTO REALIZADO: 2011
______
Joëlle: Outro projeto privado notável é o MC² - ING Louvain-la-Neuve. Trata-se do desenvolvimento de um edifício de escritórios com certificação BREEAM Excellent no âmbito da rede Nature & Entreprises (Natagora) no Parque Científico de Louvain-la-Neuve. O local e o átrio são acessíveis ao público e fazem parte da rede de mobilidade sustentável da cidade.
O projeto visou igualmente a integração de vegetação nos escritórios e no átrio. Inicialmente concebido para acolher o pessoal e as infra-estruturas informáticas do ING Bank, o edifício teve de ser repensado após o boom do teletrabalho, reduzindo as necessidades iniciais. O projeto permitiu adaptar a distribuição dos espaços para acolher outras empresas.
O que retiro desta experiência é o valor acrescentado do local, conseguido graças a uma equipa multidisciplinar que tratou meticulosamente de todos os aspectos, por dentro e por fora. O projeto transformou um terreno cultivado, inicialmente pobre do ponto de vista ecológico, num local rico em biodiversidade, integrando três lagos ecológicos, um pomar, abrigos para a vida selvagem, telhados verdes, sebes, prados floridos, um percurso pedagógico, zonas de convívio, etc. As árvores e plantas do átrio criam um diálogo com os jardins, oferecendo privacidade e convívio num ambiente de trabalho luminoso e acolhedor. A certificação Natagora implica também uma visita anual para acompanhar a evolução do sítio, o que demonstra o empenhamento real das empresas em relação ao seu impacto ambiental.
EQUIPA DE PROJECTO: J. Tintinger - L. Correia em colaboração com Skope (paisagismo) e Jasper Eyers Architects (edifício) - NCBHAM (arquitetura de interiores) - Nature In Progress (ecologista) - BECI (trabalhos exteriores) - TPF Engineering (BREEAM, PEB, estabilidade e avaliação TS) - Immo-Pro (gestão de projeto e supervisão de projeto) - BuildTIS (organismo de inspeção para trabalhos em casco fechado) - Vekmo (CSS) - D2S International (acústica) - HVS (topógrafo: levantamentos, localização e inventários) - Sol-EX (consultoria em despoluição)
FOTOS: J. Tintinger
CRIADO POR: Parcs et Jardins David Monnier
CONCLUSÃO DO PROJECTO: 2022
